segunda-feira, 11 de abril de 2011
O suco da vida
quarta-feira, 30 de março de 2011
Ao que não é muito certo

A contar, cerca de dez minutos, sei que fiquei por ali estática. Os olhos grandes e pretos eram maiores. Tomaram o meu tempo como costuma tomar o barulho da chuva. Uma certa impressão contingente, de tempo parado, que se dá por outra impressão maior. O tempo que se transforma numa visão. E os meus olhos, também, ficaram maiores. Era a cor castanha, espalhada em sur tons sobre toda a superfície de seu corpo. Seus olhos apresentavam-se flagelados, com rachaduras finas, bem finas, e negras. Eram olhos de um animal da noite, e aquela tinta, a tinta da noite, escorria por todo o resto de seu corpo, encolhido que estava, eu podia ver.
A minha visão absorvia, um sulgo denso, de uma tinta negra. Um olhar que se fazia preto, e o dia já claro, de repente, escureceu. Dizem da noite, uma sombra constante. A calma da noite, é o que dizem. Mas dele, eu só tinha a dizer medo. Um certo medo que apavora, sem causas de perigos reais. É o medo sem substância, enevoado como a nossa fantasia. A nossa fantasia. Um olhar negro aberto ao desconhecido. Um olhar que busca o que não enxerga, e tenta aprimorar da hora parada, o invisível.
Era a hora da chuva. E perto dele me aconcheguei. Como quem dorme um infinito sem hora, do prazer pelo desprendimento. Perto dele me encolhi, pela insegurança de estar tão próxima ao que não se conhece – daquele bicho que não era borboleta. Uma bruxa, poderiam dizer, mas não. Ele era belo, sua beleza transparente e leve como suas asas que dormiam. Dormi este sono em pleno dia, para me acorbertar da fina camada que nos resta, do que ainda não foi nomeado.
segunda-feira, 28 de março de 2011
No tempo do avô

Seu caminhar, a cada dia, a cada passo, vagarou-se, vagarou-se. Teve um dia que a palavra tomou o andar. Delicadamente, a palavra, e a fez sentir uma leveza que só. Eis que o encontro com o avô se deu de outra maneira. Sentava-se novamente, bem próxima ao avô, para ouvir suas histórias. E desta vez, podia a narrá-las.
Foi que percebeu, que o caminhar para frente só ganharia sentido na busca por um sonho que apenas por si é conhecido. Sonho que só se tem na infância, que, só se tem na infância. Ao desejo mais tenro, um caminho outro. Decidiu deixar os passos. Parada, reencostada sobre aquela, poltrona de couro herdada, continuou a escrevê-los.
Nunca mais sentiu o pesado.
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
Ceder à palavra

O meu amor me disse, ponteiros em meia-noite, uma, duas, três ou quatro palavras.
Naquela hora em que não tinha mais respostas, ele insistia, ponteiros, a girar.
Uma, duas, três ou quatro palavras.
Naquela hora em que já dormia, para uma outra vida.
E ele insistia.
Uma palavra cedeu, apelo sem sustento, caiu sobre o meu corpo e veio a me acordar – me assustou inclusive.
Eu enxerguei
Ponteiros sem horas, eram apenas as palavras.
Uma, duas, três.
E eu as ouvia
Uma, duas, três.
Uma, duas, três.
Numa outra vida da noite, onde eram apenas as palavras.
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
Queria eu ter sua vida, ter muito com o que me preocupar e poder dar a desculpa de não ter tempo para os livros.
Queria eu ter sua vida, viver entre as estantes.
Você não conseguiria, tens muito com o que se preocupar.
Façamos uma troca, amanhã eu leio os livros, amanhã você cuida dos meus negócios.
Não acha muito arriscado?
Se não gostasse do risco, não geria meus negócios. Ficaria lendo livros.
Posso escolher os livros?
Sim. Posso escolher os negócios?
Sim. Mas cuidado, nessa troca você pode perder muito mais do que seu dinheiro.
E o que posso ganhar?
Também muito mais do que seu dinheiro.
Então ganharei. E você, pode ganhar dinheiro, mas acho mais provável que não ganhe nada e, além de perder dinheiro, alerto, a incapacidade nos faz perder o respeito por nós mesmos.
Não me importa ser capaz à sua maneira de ser capaz.
Há outras maneiras de ser capaz?
